Em 23 de Novembro de 1961, poucos dias após o falecimento de António Costa, Octávio Sérgio publicou no jornal "O Norte Desportivo" um artigo titulado "NA MORTE DO PINTOR ANTÓNIO COSTA", que a seguir se transcreve, dada a deficiente qualidade do exemplar daquele jornal em meu poder.
"Todos nós seus amigos o sabíamos perdido, e, portanto a notícia da sua morte, ainda que muito dolorosa, não nos surpreendeu.
António Costa foi durante muitos anos um dos meus amigos mais íntimos e dedicados.
A nossa amizade de camaradas durou mais de quarenta anos e começou quando ambos éramos rapazes. Encontrámo-nos na Escola de Belas-Artes, na aula de Pintura, do mestre Marques Oliveira, e ali tivemos como companheiros, entre outros, Henrique Medina, Eduardo Malta, Barreiros da Cunha, Carlos Carneiro, Joaquim Silva e Adolfo Silva. Os meninos bonitos da aula eram Henrique Medina e Eduardo Malta, que mostravam habilidades excepcionais. António Costa, porém, nada tinha a ver com os habilidosos, pois tudo nele era inteligência, vontade de ferro, persistência, estudo e reflexão.
A biografia do Pintor ilustríssimo que foi António Costa não cabe um simples e modesto artigo de jornal. Mas é tão cheia de ensinamentos e de notas curiosas, que bem gostaria eu de a escrever um dia.
António Costa, como homem era de uma seriedade rara, verdadeiramente impressionante. A sua máscara vincada, dura, grave, encobria, porém, os sentimentos mais puros de um coração sensível. Como é natural e lógico, António Costa, como pintor, reflectia essa seriedade, essa gravidade. Continua a ser verdadeiro que "o estilo é o homem".
Não começou António Costa como "menino prodígio , não. Levou seu tempo a fazer-se, precisamente porque não era, felizmente, dotado dessa habilidade que muitas vezes se confunde com talento, quando e certo que o verdadeiro artista rarissimas vezes é habilidoso.
Destinava-o sua família ao comércio, e chegou a fazer num estabelecimento de fazendas da Rua das carmelitas a sua aprendizagem de marçano.
Mas era outro o seu destino, pelo que foi matricular-se na antiga Academia Portuense de Belas-artes, onde o fui encontrar, ele como aluno ordinário, eu como aluno voluntário.
Apesar de termos feitios muito diferentes e mentalidades em alguns pontos antagónicas, fizemos grande e leal amizade pela vida fora, e nunca entre nós houve a mais pálida diferença.É que António Costa era, antes de mais nada e acima de tudo, um homem primorosamente educado, recto e correcto.
Por isso a sua pintura foi sempre profundamente séria.
Mas tinha horror aos grupinhos, às capelinhas, e nunca logrou ter à sua volta uma corte de admiradores endinheirados. Ele próprio fugia desses meios onde é fácil triunfar, não pelo talento e pelo saber, mas, sim, pelos salamaleques, pelas reverências servis e simiescas. Já o seu próprio estilo, tão sério, tão grave, tão firme, tão sólido, afugentaria essa gente especial de certos meios a que é costume chamar …"alta sociedade".
António Costa, mesmo sempre a remar contra a maré, sem padrinhos nem mecenas, afirmou-se no nosso meio artístico, cada vez mais pobre, como um pintor de garra. Foi sobretudo um artista do claro-escuro, um desenhador de pulso, para o qual o "chiquè" das linhas escusadas era uma mentira convencional, aceite apenas pelos que ignoram completamente a seriedade do desenho.
Pintor, sim, cultivando todos os géneros, o retrato, a composição a paisagem, a natureza morta. mas foi principalmente no retrato, que continua a ser a pedra de toque dos verdadeiros artistas, que deixou bem marcada a sua garra inconfundível de mestre incontestado do claro-escuro.
Abel Salazar, há poucos anos, numa entrevista concedia a um jornal de Lisboa, falou do pintor António Costa com o maior entusiasmo. Não exagerou quando lhe chamou grande pintor, um dos mais sérios pintores portugueses do seu tempo.
Se, como amigo e camarada de tantos anos, choro e lamento a sua morte, como seu admirador afirmo que é preciso reparar uma falta: é necessário que se organize, dentro de pouco, uma grande exposição retrospectiva da sua obra , e que alguém se encarregue de escrever um estudo biográfico e crítico sobre o pintor.
Não há, em boa verdade, melhor homenagem a prestar aos que desapareceram deste mundo do que lembrar o que fizeram de melhor no trânsito da sua vida bem efémera.
António Costa estava ausente dos meios artísticos há já um bom par de anos, mas deixou uma obra que chega para assinalar a marca de um verdadeiro e sério artista."
"Todos nós seus amigos o sabíamos perdido, e, portanto a notícia da sua morte, ainda que muito dolorosa, não nos surpreendeu.
António Costa foi durante muitos anos um dos meus amigos mais íntimos e dedicados.
A nossa amizade de camaradas durou mais de quarenta anos e começou quando ambos éramos rapazes. Encontrámo-nos na Escola de Belas-Artes, na aula de Pintura, do mestre Marques Oliveira, e ali tivemos como companheiros, entre outros, Henrique Medina, Eduardo Malta, Barreiros da Cunha, Carlos Carneiro, Joaquim Silva e Adolfo Silva. Os meninos bonitos da aula eram Henrique Medina e Eduardo Malta, que mostravam habilidades excepcionais. António Costa, porém, nada tinha a ver com os habilidosos, pois tudo nele era inteligência, vontade de ferro, persistência, estudo e reflexão.
A biografia do Pintor ilustríssimo que foi António Costa não cabe um simples e modesto artigo de jornal. Mas é tão cheia de ensinamentos e de notas curiosas, que bem gostaria eu de a escrever um dia.
António Costa, como homem era de uma seriedade rara, verdadeiramente impressionante. A sua máscara vincada, dura, grave, encobria, porém, os sentimentos mais puros de um coração sensível. Como é natural e lógico, António Costa, como pintor, reflectia essa seriedade, essa gravidade. Continua a ser verdadeiro que "o estilo é o homem".
Não começou António Costa como "menino prodígio , não. Levou seu tempo a fazer-se, precisamente porque não era, felizmente, dotado dessa habilidade que muitas vezes se confunde com talento, quando e certo que o verdadeiro artista rarissimas vezes é habilidoso.
Destinava-o sua família ao comércio, e chegou a fazer num estabelecimento de fazendas da Rua das carmelitas a sua aprendizagem de marçano.
Mas era outro o seu destino, pelo que foi matricular-se na antiga Academia Portuense de Belas-artes, onde o fui encontrar, ele como aluno ordinário, eu como aluno voluntário.
Apesar de termos feitios muito diferentes e mentalidades em alguns pontos antagónicas, fizemos grande e leal amizade pela vida fora, e nunca entre nós houve a mais pálida diferença.É que António Costa era, antes de mais nada e acima de tudo, um homem primorosamente educado, recto e correcto.
Por isso a sua pintura foi sempre profundamente séria.
Mas tinha horror aos grupinhos, às capelinhas, e nunca logrou ter à sua volta uma corte de admiradores endinheirados. Ele próprio fugia desses meios onde é fácil triunfar, não pelo talento e pelo saber, mas, sim, pelos salamaleques, pelas reverências servis e simiescas. Já o seu próprio estilo, tão sério, tão grave, tão firme, tão sólido, afugentaria essa gente especial de certos meios a que é costume chamar …"alta sociedade".
António Costa, mesmo sempre a remar contra a maré, sem padrinhos nem mecenas, afirmou-se no nosso meio artístico, cada vez mais pobre, como um pintor de garra. Foi sobretudo um artista do claro-escuro, um desenhador de pulso, para o qual o "chiquè" das linhas escusadas era uma mentira convencional, aceite apenas pelos que ignoram completamente a seriedade do desenho.
Pintor, sim, cultivando todos os géneros, o retrato, a composição a paisagem, a natureza morta. mas foi principalmente no retrato, que continua a ser a pedra de toque dos verdadeiros artistas, que deixou bem marcada a sua garra inconfundível de mestre incontestado do claro-escuro.
Abel Salazar, há poucos anos, numa entrevista concedia a um jornal de Lisboa, falou do pintor António Costa com o maior entusiasmo. Não exagerou quando lhe chamou grande pintor, um dos mais sérios pintores portugueses do seu tempo.
Se, como amigo e camarada de tantos anos, choro e lamento a sua morte, como seu admirador afirmo que é preciso reparar uma falta: é necessário que se organize, dentro de pouco, uma grande exposição retrospectiva da sua obra , e que alguém se encarregue de escrever um estudo biográfico e crítico sobre o pintor.
Não há, em boa verdade, melhor homenagem a prestar aos que desapareceram deste mundo do que lembrar o que fizeram de melhor no trânsito da sua vida bem efémera.
António Costa estava ausente dos meios artísticos há já um bom par de anos, mas deixou uma obra que chega para assinalar a marca de um verdadeiro e sério artista."
Neste artigo, escrito por um grande amigo de António Costa, que com ele conviveu desde a juventude, realçam-se alguns traços da sua personalidade marcante.
Na sua parte final Octávio Sérgio deixa duas ideias: a organização de uma exposição retrospectiva e a escrita de uma biografia.
Não sendo hoje viável satisfazer qualquer um destes desideratos, resta-me, enquanto único neto vivo e passados mais de 50 anos sobre o seu falecimento, concretizar através deste blog e de uma publicação em fase de estudo uma modesta homenagem ao Homem e deixar, para memória futura, uma lembrança do que António Costa "…de melhor fez no trânsito da sua vida efémera".
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